Constituição dogmática Dei Filius (24 de abril de 1870) de Pio IX - Primeiro Concílio Ecumênico do Vaticano
PIO BISPO
SERVO DOS SERVOS DE DEUS
COM O SAGRADO CONCÍLIO APROVANDO
Para perpétua memória do feito
O Filho de Deus e Redentor do gênero humano, Nosso Senhor Jesus Cristo, prestes a voltar para o Pai celeste, prometeu que estaria presente com sua Igreja militante na terra todos os dias até a consumação dos séculos. Por isso, jamais deixou de estar presente à sua dileta Esposa, de assistir aquela que ensina, de abençoar aquela que opera, de levar auxílio àquela que se encontra em perigo. Esta verdadeiramente salutar providência d’Ele, enquanto apareceu continuamente por entre outros benefícios inumeráveis, então se tornou manifestíssima pelos frutos que sobrevieram ao orbe cristão dos Concílios ecumênicos e, de modo particular, daquele Tridentino, celebrado embora em tempos adversos. Por ele, com efeito, os santíssimos dogmas da religião foram mais estritamente definidos e mais copiosamente expostos; os erros, condenados e refreados; por ele, a disciplina eclesiástica foi restaurada e mais firmemente sancionada; foi promovido no Clero o estudo da ciência e da piedade; foram preparados colégios para os adolescentes a serem educados para a sagrada milícia; finalmente, os costumes do povo cristão foram renovados tanto pela instrução mais cuidadosa dos fiéis quanto pelo uso mais frequente dos sacramentos. Por ele, além disso, se tornou mais estreita a comunhão dos membros com a Cabeça visível, e se acrescentou vigor a todo o corpo místico de Cristo; por ele, se multiplicaram as famílias religiosas e outras instituições de piedade cristã; por ele, também aquele assíduo ardor, constante até o derramamento do sangue, na propagação do Reino de Cristo amplamente pelo mundo.
Não obstante, estes e outros insignes benefícios, que pela última especialmente Sínodo ecumênica a divina clemência concedeu à Igreja, enquanto com grato ânimo, como convém, recordamos, não podemos de modo algum reprimir a dor acerba pelos males gravíssimos, surgidos principalmente do fato de que ou a autoridade da mesma sacrossanta Sínodo foi desprezada por muitíssimos, ou seus sapientíssimos Decretos foram negligenciados.
Com efeito, ninguém ignora que as heresias, que os Padres de Trento proscreveram, enquanto, rejeitado o magistério divino da Igreja, as coisas que dizem respeito à religião eram entregues ao juízo de qualquer particular, dissolveram-se pouco a pouco em múltiplas seitas, as quais, discordando e contendendo entre si, finalmente em não poucos foi abalada toda a fé em Cristo. Por isso, as próprias Sagradas Escrituras, que antes eram afirmadas como única fonte e juíza da doutrina cristã, começaram já a não ser tidas como divinas, mas, sim, a ser contadas entre os comentários míticos.
Então nasceu e demasiado largamente pelo orbe se espalhou aquela doutrina do racionalismo ou do naturalismo, a qual, opondo-se por todas as formas à religião cristã, enquanto instituto sobrenatural, com o máximo empenho se esforça para que, excluído das mentes humanas, da vida e dos costumes dos povos Cristo, que é o único nosso Senhor e Salvador, se estabeleça o reino da chamada pura razão ou da natureza. Contudo, abandonada e rejeitada a religião cristã, negado o verdadeiro Deus e o seu Cristo, precipitou-se enfim a mente de muitos no abismo do panteísmo, do materialismo, do ateísmo, de tal modo que, negando agora a própria natureza racional e toda norma do justo e do reto, se esforçam por destruir os fundamentos mais profundos da sociedade humana.
Ora, com esta impiedade alastrando por toda parte, sucedeu infelizmente que também muitos dentre os filhos da Igreja Católica se desviassem do caminho da verdadeira piedade, e, entre eles, diminuídas pouco a pouco as verdades, atenuou-se o senso católico. Com efeito, seduzidos por várias e estranhas doutrinas, misturando de modo impróprio a natureza e a graça, a ciência humana e a fé divina, vêm-se a perverter o genuíno sentido dos dogmas, que sustenta e ensina a Santa Mãe Igreja, e a pôr em perigo a integridade e a sinceridade da fé.
Posto tudo isso claramente, como pode acontecer que não se comovam as entranhas íntimas da Igreja? Pois, assim como Deus quer que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade; assim como Cristo veio para salvar o que tinha perecido, e para congregar em um só os filhos de Deus que estavam dispersos; assim também a Igreja, constituída por Deus como Mãe e Mestra dos povos, sabe-se devedora a todos, e sempre está pronta e atenta a levantar os caídos, a sustentar os vacilantes, a abraçar os que retornam, a confirmar os bons e a conduzi-los a coisas melhores. Por isso, jamais pode cessar, em tempo algum, de testemunhar e de pregar a verdade de Deus, que cura todas as coisas, não ignorando que lhe foi dito: O meu espírito, que está em ti, e as minhas palavras, que pus na tua boca, não se apartarão da tua boca desde agora e para sempre (Is. LIX, 21).
Nós, portanto, aderindo aos vestígios de Nossos Predecessores, pelo Nosso supremo múnus Apostólico, jamais deixamos de ensinar e de defender a verdade católica e de reprovar as doutrinas perversas. Agora, porém, estando sentados conosco e julgando os Bispos do orbe inteiro, congregados nesta Sínodo ecumênica por Nossa autoridade no Espírito Santo, apoiados na palavra de Deus escrita e transmitida, conforme a recebemos santamente guardada e genuinamente exposta pela Igreja católica, da Cátedra de Pedro, em presença de todos, estabelecemos professar e declarar a salutar doutrina de Cristo, proscritos e condenados, com o poder a nós entregue por Deus, os erros contrários.
CAPÍTULO I
DE DEUS, CRIADOR DE TODAS AS COISAS
A Santa Igreja Católica Apostólica Romana crê e confessa que há um só Deus verdadeiro e vivo, Criador e Senhor do céu e da terra, onipotente, eterno, imenso, incompreensível, infinito em inteligência, vontade e toda perfeição; o qual, sendo uma substância espiritual única, singular, absolutamente simples e imutável, deve ser proclamado realmente e essencialmente distinto do mundo, em si e por si beatíssimo, e, sobre todas as coisas que estão e que podem ser concebidas fora d’Ele, inefavelmente excelso.
Este único Deus verdadeiro, pela sua bondade e virtude onipotente, não para aumentar sua beatitude, nem para adquiri-la, mas para manifestar sua perfeição por meio dos bens que concede às criaturas, com o mais livre conselho desde o princípio do tempo criou ambas do nada, a criatura espiritual e a corporal, a saber, a angelical e a terrena, e depois a humana, como comum, constituída de espírito e corpo (Concílio de Latrão IV, cap. Firmemente).
Todas, porém, as coisas que criou, Deus com sua providência protege e governa, alcançando firmemente de um fim até o outro, e dispondo tudo suavemente (Sab. VIII, 1). Pois todas estão nuas e abertas aos seus olhos (Cf. Hebr. IV, 13), inclusive aquelas que hão de ser por livre ação das criaturas.
CAPÍTULO I
DA REVELAÇÃO
CAPÍTULO III
DA FÉ
Visto que o homem depende inteiramente de Deus, como seu Criador e Senhor, e a razão criada está profundamente sujeita à Verdade increada, somos obrigados a prestar plena obediência da inteligência e da vontade a Deus revelador por meio da fé. Esta fé, que é o começo da salvação humana, a Igreja Católica professa ser uma virtude sobrenatural, pela qual, aspirando e auxiliando a graça de Deus, acreditamos que aquilo que Ele revelou é verdadeiro, não por causa da verdade intrínseca das coisas percebida pela luz natural da razão, mas pela autoridade daquele Deus que revela, que não pode enganar nem ser enganado. Pois a fé é, segundo testemunha o Apóstolo, a substância das coisas que se esperam, o argumento das coisas que não se veem (Hebr. XI, 1).
Para que, contudo, a obediência da nossa fé fosse conforme à razão, Deus quis que, juntamente com as ajudas internas do Espírito Santo, fossem unidas externamente as provas da sua revelação, isto é, os feitos divinos, e principalmente os milagres e profecias, que, mostrando claramente o Deus todo-poderoso e seu conhecimento infinito, são os sinais mais certos da revelação divina e adequados a toda inteligência. Por isso, tanto Moisés e os Profetas, quanto sobretudo o próprio Cristo Senhor, realizaram muitos e manifestos milagres e profecias; e sobre os Apóstolos lemos: Estes, porém, partiram e pregaram por toda parte, com o Senhor cooperando e confirmando a palavra pelos sinais que se seguiram (Marcos XVI, 20). E novamente está escrito: Temos, portanto, uma palavra profética mais firme, à qual fazeis bem em estar atentos, como a uma lâmpada que brilha numa lugar escuro (2 Pedro I, 19).
Embora o assentimento da fé não seja de modo algum um movimento cego da mente, ninguém, contudo, pode consentir na pregação evangélica, como convém para alcançar a salvação, sem a iluminação e inspiração do Espírito Santo, que dá a todos suavidade em consentir e crer na verdade (Concílio de Arles I, pág. 7). Por isso, a própria fé em si, mesmo que não opere pela caridade, é dom de Deus, e seu ato é obra relativa à salvação, pela qual o homem presta livremente a Deus obediência, consentindo e cooperando com a sua graça, à qual poderia resistir.
Além disso, pela fé divina e católica devem ser cridas todas aquelas coisas que se contêm na palavra de Deus, escrita ou transmitida, e que pela Igreja, seja por julgamento solene, seja por magistério ordinário e universal, são propostas para crer como divinamente reveladas.
Porquanto, de fato, sem fé é impossível agradar a Deus e chegar à comunhão de seus filhos; por isso, a ninguém alguma vez ocorreu a justificação sem ela, nem qualquer um, a não ser que nela perseverasse até o fim, alcançará a vida eterna. Para que, porém, pudéssemos cumprir o dever de abraçar a verdadeira fé e perseverar firmemente nela, Deus instituiu a Igreja por seu Filho unigênito, e a instruiu com sinais manifestos de sua instituição, para que ela pudesse ser reconhecida por todos como guardiã e mestra da palavra revelada. Pois tudo aquilo que está tão abundantemente e tão admiravelmente disposto divinamente para a evidente credibilidade da fé cristã pertence à única Igreja católica. Antes, até a própria Igreja, por si mesma, por sua admirável propagação, excecional santidade e inexaurível fecundidade em todos os bens, pela unidade católica e invencível estabilidade, é uma grande e perpétua razão de credibilidade e testemunho irrefutável de sua divina missão.
Por onde sucede que ela própria, como que sinal levantado entre as nações (Is. XI, 12), tanto convida a si os que ainda não creram, como faz certos seus filhos de que a fé, que professam, se apoia no firmíssimo fundamento. A este testemunho, com efeito, junta-se auxílio eficaz da virtude sobrenatural. Com efeito, o benigníssimo Senhor tanto excita e ajuda com sua graça os que erram, para que possam chegar ao conhecimento da verdade, quanto confirma com sua graça aqueles que transferiu das trevas para sua admirável luz, para que perseverem nesta mesma luz, não os desamparando, a não ser que seja desamparado. Por isso, de modo algum é igual a condição daqueles que, pelo celeste dom da fé, aderiram à verdade católica, e daqueles que, guiados por opiniões humanas, seguem uma religião falsa; pois aqueles que sob o magistério da Igreja receberam a fé nunca podem ter justa causa de mudá-la ou de colocá-la em dúvida. Sendo estas coisas assim, rendendo graças a Deus Pai, que nos fez dignos de participar da sorte dos santos na luz, não negligenciemos tão grande salvação, mas, olhando para o autor da fé e consumador, Jesus, mantenhamos firme a confissão de nossa esperança, sem declinar.
CAPÍTULO IV
DA FÉ E RAZÃO
Isto também o perpétuo consenso da Igreja católica sustentou e sustenta, que há dupla ordem de conhecimento, não só distinta pelo princípio, mas também pelo objeto: quanto ao princípio, com efeito, porque em um conhecemos pela razão natural, no outro pela fé divina; quanto ao objeto, porém, porque, além daquelas coisas às quais a razão natural pode chegar, nos são propostos a crer mistérios ocultos em Deus, os quais não podem ser conhecidos, a não ser que sejam divinamente revelados. Por isso, o Apóstolo, que testifica que Deus é conhecido pelos gentios por meio das coisas que foram feitas, todavia, dissertando sobre a graça e a verdade, que foram feitas por Jesus Cristo (João I, 17), pronuncia: Falamos a sabedoria de Deus em mistério, que está oculta, a qual Deus predestinou antes dos séculos para nossa glória, a qual nenhum dos príncipes deste século conheceu; mas a nós Deus a revelou por seu Espírito; o Espírito, com efeito, tudo perscruta, até mesmo as profundezas de Deus (1 Cor. II, 7-9). E o próprio Unigênito confessa ao Pai, porque escondeste estas coisas aos sábios e prudentes, e as revelaste aos pequeninos (Matth. XI).
E, com efeito, a razão, iluminada pela fé, quando diligente, piedosa e sobriamente busca, alcança, Deus concedendo, alguma inteligência dos mistérios, e esta utilíssima, tanto pela analogia das coisas que conhece naturalmente, como pela conexão dos próprios mistérios entre si e com o fim último do homem; nunca, contudo, torna-se idônea para perscrutá-los à semelhança das verdades que constituem o próprio objeto dela. Com efeito, os divinos mistérios, por sua própria natureza, excedem de tal modo o intelecto criado, que, mesmo transmitidos pela revelação e recebidos pela fé, todavia permanecem cobertos pelo véu da própria fé e como que envoltos por certa obscuridade, enquanto nesta vida mortal peregrinamos longe do Senhor: pois caminhamos pela fé, e não pela visão (2 Cor. V, 7).
Todavia, ainda que a fé esteja acima da razão, nenhuma verdadeira dissensão jamais pode haver entre a fé e a razão: pois o mesmo Deus, que revela os mistérios e infunde a fé, inseriu no ânimo humano a luz da razão; ora, Deus não pode negar a Si mesmo, nem jamais o verdadeiro pode contradizer o verdadeiro. Contudo, a aparência vã desta contradição surge principalmente daí, que ou os dogmas da fé não foram entendidos e expostos segundo o espírito da Igreja, ou que os postulados das opiniões sejam tomados como sentenças da razão. Por conseguinte, definimos que toda e qualquer assertiva contrária à verdade iluminada pela fé é absolutamente falsa (Conc. Lat. V, Bula Apostolici regiminis). Além disso, a Igreja, que juntamente com o ofício apostólico de ensinar recebeu o mandamento de guardar o depósito da fé, possui também por direito divino tanto o dever como o encargo de proscrever a ciência falsamente assim chamada, para que ninguém seja enganado pela filosofia e pela vã falácia (Coloss. II, 8). Por isso, todos os fiéis cristãos estão obrigados a não somente se abster de defender como legítimas conclusões da ciência aquelas opiniões que se sabem contrárias à doutrina da fé, especialmente se tiverem sido reprovadas pela Igreja, mas também a tê-las absolutamente como erros, que ostentam uma enganosa aparência de verdade.
Nem, com efeito, a doutrina da fé, que Deus revelou, foi proposta como invenção filosófica a ser aperfeiçoada pelos engenhos humanos, mas, como depósito divino, foi entregue à Esposa de Cristo, para ser fielmente guardada e infalivelmente declarada. Daí também o sentido dos sagrados dogmas deve ser perpetuamente retido, aquele que uma vez declarou a Santa Mãe Igreja, e jamais se deve dele se afastar, sob aparência e nome de mais alta inteligência. Cresça, portanto, e muito e fortemente progrida, tanto dos indivíduos quanto de todos, tanto de um homem quanto de toda a Igreja, segundo os graus das idades e dos séculos, a inteligência, a ciência, a sabedoria; mas unicamente no seu próprio gênero, isto é, no mesmo dogma, no mesmo sentido e na mesma sentença (Vinc. Ler. Common., n. 28).
Cânones
Se alguém negar ser um só e verdadeiro Deus, Criador e Senhor das coisas visíveis e invisíveis; seja anátema.
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Se alguém não se envergonhar de afirmar que nada existe além da matéria; seja anátema.
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Se alguém disser que uma e a mesma é a substância ou essência de Deus e das coisas todas; seja anátema.
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Se alguém disser que as coisas finitas, tanto corpóreas quanto espirituais, ou ao menos as espirituais, emanaram da substância divina; ou que a essência divina, pela sua manifestação ou evolução, se faz todas as coisas; ou, enfim, que Deus é um ente universal ou indefinido, que, determinando-se a si mesmo, constitui a universalidade das coisas, distinta em gêneros, espécies e indivíduos; seja anátema.
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Se alguém não confessar que o mundo, e todas as coisas que nele se contêm, tanto espirituais quanto materiais, segundo toda a sua substância, foram produzidas por Deus do nada; ou disser que Deus não criou por vontade livre de toda necessidade, mas tão necessariamente quanto necessariamente ama a si mesmo; ou negar que o mundo foi criado para a glória de Deus; seja anátema.
II. Sobre a Revelação
- Se alguém disser que Deus, um e verdadeiro, Criador e Senhor nosso, por meio das coisas que foram feitas, não pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razão humana; seja anátema.
- Se alguém disser que não pode ser feito, ou que não convém, que por revelação divina o homem seja instruído acerca de Deus e do culto que Lhe deve ser prestado; seja anátema.
- Se alguém disser que o homem não pode ser elevado divinamente ao conhecimento e à perfeição que excedem o natural, mas que de si mesmo pode e deve, por contínuo progresso, chegar por fim à posse de toda verdade e de todo bem; seja anátema.
- Se alguém não receber como sagrados e canônicos os livros da Sagrada Escritura inteiros, com todas as suas partes, conforme os enumerou o santo Concílio de Trento, ou negar que eles foram divinamente inspirados; seja anátema.
III. Sobre a Fé
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Se alguém disser que a razão humana é de tal modo independente, que a fé não pode ser-lhe imposta por Deus; seja anátema.
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Se alguém disser que a fé divina não se distingue do conhecimento natural de Deus e das coisas morais, e por conseguinte, que para a fé divina não se requer que a verdade revelada seja crida por causa da autoridade de Deus que revela; seja anátema.
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Se alguém disser que a revelação divina não pode ser tornada crível por sinais externos, e que, portanto, só pela experiência interna de cada um ou pela inspiração privada os homens devem ser movidos à fé; seja anátema.
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Se alguém disser que milagres não podem de modo algum acontecer, e, por conseguinte, que todas as narrações deles, mesmo as contidas na Sagrada Escritura, devem ser relegadas entre fábulas ou mitos; ou que os milagres nunca podem ser conhecidos com certeza, nem que por eles possa ser devidamente provada a origem divina da religião cristã; seja anátema.
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Se alguém disser que o assentimento da fé cristã não é livre, mas que é necessariamente produzido pelos argumentos da razão humana; ou que, para a fé viva unicamente, que opera pela caridade, é necessária a graça de Deus; seja anátema.
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Se alguém disser que é igual a condição dos fiéis e a daqueles que ainda não chegaram à única verdadeira fé, de tal modo que os católicos possam ter justa causa para suspender o assentimento da fé que já receberam sob o magistério da Igreja, colocando-a em dúvida, até que tenham concluído a demonstração científica da credibilidade e verdade de sua fé; seja anátema.
IV. Sobre a Fé e a Razão
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Se alguém disser que na revelação divina não se contém verdadeiros e propriamente ditos mistérios, mas que todos os dogmas da fé podem ser devidamente cultivados pela razão e entendidos e demonstrados a partir dos princípios naturais; seja anátema.
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Se alguém disser que as disciplinas humanas devem ser tratadas com tal liberdade que suas afirmações, ainda que contrárias à doutrina revelada, possam ser mantidas como verdadeiras, e que não possam ser proibidas pela Igreja; seja anátema.
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Se alguém disser que pode acontecer que aos dogmas propostos pela Igreja deva ser atribuído, às vezes segundo o progresso da ciência, um sentido diverso daquele que a Igreja entendeu e entende; seja anátema.
Assim, cumprindo o dever supremo do nosso ministério pastoral, exortamos todos os fiéis de Cristo, especialmente aqueles que exercem o ofício de ensinar ou governar, pelas entranhas de Jesus Cristo, e também por autoridade do mesmo Deus e Salvador nosso, para que a fim de afastar e eliminar esses erros, e para difundir a luz da fé puríssima, dediquem diligência e esforço.
Pois não basta evitar a perversidade herética, se também não forem diligentemente evitados aqueles erros que a ela se aproximam mais ou menos; advertimos todos no exercício do seu dever que também guardem as Constituições e Decretos, pelos quais opiniões erradas desse tipo, que não são aqui enumeradas expressamente, foram proibidas e reprovadas por esta Santa Sé.
ASS, vol. V (1869-1870), pp. 481-493.
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